Lições nas palavras de uma preta velha


Amanhece mais um dia na grande capital paulista, descortina-se mais um ensolarado sábado de verão, quando o relógio marca 07:00 da manhã Mãe Zefa, como é conhecida carinhosamente, desperta para mais um fim de semana em que abrirá as portas de seu terreiro para seus filhos e todos os necessitados que à sua casa espiritual viessem pedir ajuda.

Como de costume Mãe Zefa se levanta, lava o rosto, escova os dentes e vai para a cozinha onde prepara cafézinho preto de cada dia, cujo primeiro gole é retirado e ofertado à Vovó Maria.

Calmamente ela toma seu café com um pedaço de pão com manteiga, ao terminar seu desjejum ela se dirige novamente ao seu quarto onde se troca, coloca uma roupa do dia a dia e vai para a parte dos fundos de sua casa onde fica a pequena edícula onde está seu congá e é também o local onde atende a todos que vêm em busca de socorro ou alento espiritual.

Já são 08:00 da manhã, Mãe Zefa pega um balde enche d'água coloca gotas de alfazema, e começa a limpar todos os móveis e imagens que estão na pequena edícula para só então pegar um rodo e limpar o chão com a água de cheiro.

Depois de limpar tudo e arrumar as cadeiras para o trabalho do dia, Mãe Zefa vai verificar as velas do altar e da tronqueira e verificar o que é preciso ser feito para os trabalhos do dia.

Após terminar as tarefas e limpeza e organização do templo Mãe Zefa volta para dentro de sua casa e vai preparar um refeição leve, quando o almoço está pronto, ela come, e vai para seu quarto para separar sua roupa branca, suas guias e seu pano de cabeça.

Então ela volta à cozinha para lavar a louça do almoço e coloca água para fever em uma panela para fazer seu banho de ervas, após preparado o banho ela se prepara para tomar seu banho de higiene pessoal e seu banho de ervas.

Ela olha para o relógio e pensa: "Nossa como as horas passaram rápido!!!" 

São 14:00, faltam 2 horas para os trabalhos começarem, entram ela se troca, com muito amor e respeito põe suas guias no pescoço e o pano de cabeça e se dirige para o portão para abrí-lo.

Como de costume um ou dois filhos já a esperam no portão, pedem-lhe a benção e vão se trocar.

Após todos os filhos chegar, ouvir todos os problemas de cada um, receber com carinho a assistência ouvir seus problemas também é chegada a hora de começar os trabalhos do dia.

Depois de algumas horas do trabalho é o momento e encerrar a gira, fechar o terreiro e descansar.

No dia seguinte Mãe Zefa cumpre a rotina matinal e se dirige ao terreiro para recolher as borras de velas, restos de ervas, recolher os "lixinhos" onde as entidades batem as cinzas, coloca todo o lixo em um saco e leva pra rua. 

Quando volta prepara um balde d'água com alfazema e limpa o chão e as cadeiras e só então volta para dentro de sua casa para descansar.

Na semana seguinte Mãe Zefa havia se programado para girar com nossos queridos vovôs e vovós de Aruanda. Cumpriu todo o ritual como de costume após a abertura da gira a corimba começa a tocar o ponto de chamada de Vovó Maria.

Vovó Maria chega, faz suas saudações, risca e firma seu ponto, pede o cachimbo, os ramos de alecrim e guiné, respira fundo, e chama a todos para se sentarem a sua frente, inclusive a assistência:

"Meus fios quiridus, ocês tem arcançadu muitas graça aqui cas bença de nossu Sinhô Jesus Cristo, né memo? Sempre que ocêis chega aqui meu apareinhu tá aqui de braçus abertu pra recebê ocêis e orvi seus probrema, né mesmo?" fez uma pausa baforou o cachimbo e olhou para todos.

Foi quando todos responderam que sim e então ela continuou.

"Pois bem meus fiu, agora essa nega véia pregunta. Quem docêis se preocupô pelo menos uma veiz em sabê que se esse meu apareinhu tá bem? Se esse meu apareinhu percisa de ajuda com os afazer da lida do terreiro?"

Fez se um silêncio total... e então Vó Maria continuou.

"É meus fio... Mas o erro não é só docêis, meu pareinhu também errô pruque nunca pidiu ajuda. Mas tem uma coisa ocês chama ela de MÃE, não chama? E ela ocêis de fio, né mesmo?"

Sim vó, todos responderam. Ela continuou.

"Meus fio, em famia, todas as responsabilidade são dividida, uns tem mais responsabilidade, por isso são chamados de pai e mãe e outros menos por isso são chamados de fios."

Nesse momento todos estavam comovidos com as palavras de sabedoria de 
Vó Maria que completou.

"Famia pra sê famia tem que sê unida meus fio, fica essas palavra procêis pensá, hoje num vai tê atendimentu individuá, ocêis já receberam os passe que tavam carecendo enquanto essa nega véia falava coceis, agora vortem pros seus canzuá e pensa no que nega véia falô. Fica nas bença di Nossu Sinhô Jesus Cristu."

E Vó Maria se foi.

Espero que tenham gostado desse conto, que foi ditado por Vovó Joana.

Um abraço fraterno.

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